Aqui se faz, aqui se paga: Acostumados com frases de efeito contra adversários, governadores de direita são atacados por filhos de Bolsonaro
Carlos e Eduardo Bolsonaro atacam Tarcísio, Ratinho Junior e Caiado, chamados de "ratos" e "oportunistas", enquanto ainda apostam na reversão jurídica do pai inelegível, sob risco de penas superiores a 40 anos de prisão

Luciano Meira
A oficialização da pré-candidatura de Romeu Zema (Novo) à Presidência da República colocou em ebulição as relações da direita nacional. O objetivo de Zema em liderar o campo conservador despertou insatisfação pública dos filhos do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), Carlos e Eduardo. Eles usaram as redes sociais para atacar, sem meias palavras, governadores até então tratados como aliados, como Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), Ratinho Junior (PSD-PR) e Ronaldo Caiado (União-GO), todos cotados para disputar o espólio eleitoral de Bolsonaro.
O maior alvo das críticas foi a postura dos governadores de direita diante do protagonismo bolsonarista e da debilidade jurídica do ex-presidente. Carlos Bolsonaro foi duro: chamou os governadores de “ratos oportunistas” e acusou-os de capitularem quando Bolsonaro ficou inelegível. “O mercado e o próprio interesse estão acima de qualquer pessoa que tenha ideais conservadores sinceros”, afirmou em seu perfil na rede X, antigo Twitter. Em texto ácido, Carlos acusou os governadores de se limitarem a gritar “Fora PT”, sem qualquer entrega efetiva e sem demonstrar “lealdade com a base”. Disse ainda que tais nomes “preferem o próprio interesse e os amigos do sistema sujo e canalha”, curiosamente o mesmo sistema que há muito tempo, sustenta ele e toda sua família.
Eduardo Bolsonaro, mesmo residindo nos Estados Unidos — onde atua como traidor da pátria e é lembrado pelo apoio ao tarifaço imposto aos produtos brasileiros durante o governo Trump, e por restrições legais à atuação de autoridades nacionais nos EUA — endossou e compartilhou as falas do irmão, deixando claro seu incômodo com a organização da nova direita que floresce à margem do bolsonarismo.
O pano de fundo das manifestações é a “herança” deixada por Jair Bolsonaro, hoje inelegível até 2030 após decisão do TSE por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação nas eleições de 2022. A situação jurídica do ex-presidente se agravou nos últimos meses, com múltiplos inquéritos tramitando no Supremo Tribunal Federal. As acusações vão de participação em tentativa de golpe ao descaso na pandemia, e os juristas avaliam que, somadas, as penas podem ultrapassar 40 anos de cadeia. Mesmo diante do risco concreto de condenação severa, os filhos do ex-mandatário apostam em uma improvável reviravolta judicial, como se o patriarca ainda pudesse ser peça central na próxima disputa presidencial.
A postura de Carlos e Eduardo reacendeu o debate sobre o futuro da direita no país. Os governadores, que até aqui buscavam se destacar como alternativas à figura do ex-presidente, viram seus movimentos públicos duramente repreendidos. As declarações também trouxeram à tona os métodos polêmicos do chamado “gabinete do ódio”, núcleo que funcionou no Planalto sob comando de Carlos e ficou famoso por atacar adversários e disseminar desinformação. Para o bolsonarismo, a disputa não é apenas eleitoral: é uma batalha pela fidelidade e pelo controle simbólico da pauta conservadora.
No centro desse embate, Zema tornou-se alvo preferencial por se antecipar na corrida presidencial, enquanto Tarcísio, Ratinho e Caiado são acusados de priorizar alianças e interesses pessoais em detrimento da causa bolsonarista. Para quem acompanha os bastidores, a reação dos Bolsonaros — marcada por ressentimento, ironias e ataques — indica o enfraquecimento de um projeto político que hoje sobrevive mais na nostalgia do que em chances reais de voltar ao poder.