Manifestações tomam capitais contra projetos de anistia e blindagem parlamentar
Brasil vê atos em todas as capitais contra propostas que favorecem parlamentares e anistiam golpistas

Luciano Meira
Multidões ocuparam neste domingo (21) as ruas das 27 capitais brasileiras e dezenas de cidades em protestos contra o avanço de projetos considerados blindagem para parlamentares e a anistia de envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023. Os manifestantes exigiram responsabilidade e cobraram compromisso do Congresso Nacional com a democracia.
Os atos foram organizados por movimentos sociais, sindicatos, partidos políticos e receberam o apoio de diversos artistas brasileiros. Em São Paulo, mais de 42 mil pessoas ocuparam a Avenida Paulista, enquanto milhares foram às ruas em cidades como Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador, Recife, Brasília e Manaus. As manifestações transcorreram de forma pacífica.
Líderes de partidos de esquerda, como PT, PSOL, PCdoB e PSB, compareceram às manifestações, lado a lado com representantes da sociedade civil. Shows de músicos como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Djavan e Chico Buarque puxaram ainda mais a atenção para os protestos, mostrando a amplitude do descontentamento.
O que é a PEC da Blindagem?
Chamada oficialmente de Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/2021, a chamada “PEC da Blindagem” e popularmente batizada de “PEC da Bandidagem” já foi aprovada pela Câmara dos Deputados e seguirá agora para votação no Senado. O texto prevê que qualquer abertura de ação penal contra deputados e senadores dependa de autorização prévia e em votação secreta pelas casas legislativas. Outro ponto polêmico é o fortalecimento do foro privilegiado, inclusive para presidentes de partidos, dificultando investigações e ações penais contra congressistas.
Especialistas e entidades de combate à corrupção alertam que a medida pode representar um retrocesso nos mecanismos de responsabilização por crimes como desvio de emendas parlamentares, facilitando práticas ilícitas e minando a transparência.
A mobilização também centrou suas críticas no avanço do Projeto de Lei 2162/2023, que tramita em regime de urgência, com apoio de parte expressiva da bancada bolsonarista. O texto propõe perdão legal a envolvidos nos protestos antidemocráticos que culminaram na invasão e depredação dos prédios dos Três Poderes em Brasília, após a eleição de 2022. A urgência aprovada faz com que o projeto possa ser votado diretamente no plenário da Câmara a qualquer momento, sem passar por comissões.
Aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro pretendem incluir o próprio na anistia, mesmo após sua condenação pelo Supremo Tribunal Federal a mais de 27 anos de prisão. Setores contrários à medida enxergam o projeto como uma tentativa de apagar crimes contra a democracia brasileira, minando princípios básicos de responsabilização e justiça.
Os protestos do dia 21 de setembro refletem uma crescente insatisfação popular diante do que muitos consideram movimentos do Congresso para proteger seus próprios membros de investigações criminais e garantir a impunidade para crimes graves contra o Estado Democrático de Direito. Cartazes com frases como “sem anistia” e “o Brasil é nosso” sintetizaram o espírito dos atos.
No recente roteiro tragicômico das manifestações brasileiras, setembro conseguiu superar até os roteiristas mais ousados do cinema nacional. No dia 7, bolsonaristas, no auge do fervor da defesa dos golpistas, decidiram que o melhor símbolo para o Dia da Independência do Brasil seria uma gigantesca bandeira dos Estados Unidos—afinal, quem nunca confundiu Brasília com Washington, não é mesmo? Já ontem, em um twist digno de novela das nove, os manifestantes contrários à anistia e à blindagem estenderam bandeiras do Brasil e bradaram pela soberania nacional, deixando claro de que lado cada grupo está.
Analistas avaliam que essa mobilização nacional pode pressionar o Senado e influenciar os rumos dos projetos em debate. Enquanto setores do Congresso falam em “pacificação nacional”, participantes das manifestações destacam que não há democracia sem responsabilização e transparência.