General diz ter tentado demover Bolsonaro do golpe e defesa expõe trama no STF
No julgamento do STF sobre tentativa de golpe, defesa do ex-ministro da Defesa afirma que general Paulo Sérgio Nogueira agiu para impedir ruptura institucional e confirma existência de plano em andamento para barrar posse de Lula

Luciano Meira
A defesa do general da reserva Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa do governo Jair Bolsonaro, apresentou nesta quarta-feira (3) ao Supremo Tribunal Federal (STF) a tese de que seu cliente atuou para demover Bolsonaro de uma tentativa de golpe de Estado com o objetivo de impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva. O argumento, central na sustentação oral do advogado Andrew Fernandes Farias, resultou na confirmação — no próprio plenário do STF — de que havia articulação dentro do governo para romper a ordem democrática após as eleições de 2022.
Defesa admite plano e expõe então presidente
Segundo o discurso do advogado, Paulo Sérgio Nogueira teria se oposto à ideia de ruptura institucional desde o início dos debates golpistas e trabalhou ativamente, ao lado de outros militares, para “demover o presidente Jair Bolsonaro” de tentar reverter o resultado eleitoral por meios ilegais. Em sua fala, Fernandes afirmou que Nogueira, com o apoio do ex-comandante da Aeronáutica Baptista Júnior, sugeriu a Bolsonaro um pronunciamento reconhecendo a vitória de Lula e atuou para desmobilizar protestos e evitar o agravamento da crise política.
A defesa, no entanto, confirmou a existência de um plano em discussão para impedir a posse de Lula e destacou que o general foi afastado justamente por se recusar a apoiar medidas mais radicais. O principal delator do caso, o brigadeiro Baptista Júnior, corroborou essa versão em depoimento, e o ex-ajudante de ordens Mauro Cid confirmou que Nogueira encaminhou sugestões de discurso para Bolsonaro.
Quem são os réus, os crimes e as penas possíveis
O julgamento em curso no STF envolve oito réus, considerados o chamado “núcleo 1” da trama golpista, entre eles Jair Bolsonaro e seus principais assessores militares e civis:
Jair Bolsonaro (ex-presidente)
Alexandre Ramagem (deputado e ex-diretor da Abin)
Almir Garnier (ex-comandante da Marinha)
Anderson Torres (ex-ministro da Justiça)
Augusto Heleno (ex-ministro do GSI)
Mauro Cid (ex-ajudante de ordens)
Paulo Sérgio Nogueira (general e ex-ministro da Defesa)
Walter Braga Netto (ex-ministro da Defesa e Casa Civil, candidato a vice em 2022)
Contra eles pesam as acusações de tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa armada, dano qualificado ao patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado. As penas somadas podem superar 30 anos de prisão, dependendo das circunstâncias e agravantes como uso de arma ou envolvimento de agentes públicos.
Como foi o segundo dia do julgamento no STF
O segundo dia do julgamento foi marcado pelas sustentações orais das defesas, que começaram tentando afastar, sem sucesso, a gravidade das acusações. O advogado de Nogueira procurou desvincular seu cliente do núcleo golpista, argumentando que “atuou para impedir” e foi alvo de ataques dos radicais por sua resistência.
A defesa de Bolsonaro também centrou esforços em desqualificar as provas da chamada “minuta do golpe”, uma espécie de roteiro golpista apreendido pela Polícia Federal. Segundo os advogados, o ex-presidente teria pedido a desmobilização e colaboração na transição de governo, mas a Procuradoria rebate com evidências de que o grupo, incluindo militares, buscou legitimar dúvidas sobre o sistema eleitoral e planejaram estratégias para impedir a posse de Lula.
Próximos passos do julgamento
Após a conclusão das sustentações orais, os ministros do STF devem iniciar, na próxima terça-feira (9), a votação que decidirá pela condenação ou absolvição dos réus do núcleo 1. Expectativa é de julgamento histórico, com potencial de fixar jurisprudência para crimes contra o Estado Democrático de Direito em contextos de contestação eleitoral.
Para entender o caso
A denúncia que deu origem ao julgamento sustenta que o grupo liderado por Bolsonaro, com apoio de generais e civis, tramou para anular as eleições de 2022 e impedir a posse de Lula. Para isso, teria apostado em discursos de fraude, relatórios militares sobre as urnas eletrônicas e no engajamento de setores das Forças Armadas em atos antidemocráticos. As investigações revelaram reuniões, documentos e articulação permanente para que um possível decreto de Estado de Defesa ou Sítio impedisse a transição de poder.
A exposição feita pela própria defesa de Nogueira, ao afirmar que o general tentou impedir o golpe, acabou por confirmar no plenário do Supremo aquilo que o governo Bolsonaro sempre negou: havia sim um plano golpista em andamento — cuja extensão e participação ativa dos réus seguirá sob análise dos ministros do STF.