Golpistas do “núcleo 1” ignoram provas e apostam em defesas de roteiro impossível

Apesar do vasto conjunto de prova envolvidos na tentativa de golpe mantêm uma defesa uníssona que desafia a lógica

Fotos: Arquivo – Arte RMC
Luciano Meira

Os acusados no chamado “núcleo 1” — grupo composto pelo ex-presidente, ministros e militares que, segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), arquitetaram uma tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022 — lançam mão de defesas tão fantasiosas quanto desvinculadas da realidade. Ignoram a avalanche de provas robustas, desde gravações, documentos oficiais e depoimentos, até registros de reuniões e ações concretas, preferindo apresentar narrativas que mais parecem roteiros de filmes mal escritos.

Quem são e de que são acusados os réus do Núcleo 1

Além de Bolsonaro, apontado como líder da tentativa de golpe, integram o Núcleo 1 sete figuras centrais:

Walter Braga Netto, general do Exército, ex-ministro da Defesa e da Casa Civil, candidato a vice-presidente em 2022;

Alexandre Ramagem, deputado federal (PL-RJ), ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin);

Almir Garnier, almirante de esquadra, ex-comandante da Marinha;

Anderson Torres, delegado federal, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do DF;

Augusto Heleno, general do Exército, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI);

Paulo Sérgio Nogueira, general do Exército, ex-ministro da Defesa;

Mauro Cid, tenente-coronel do Exército, ex-ajudante de ordens da Presidência — destaque por ter sido o primeiro a entregar sua defesa, resultado de acordo de delação premiada com a Polícia Federal, colocando sob suspeita toda a cadeia de comando envolvida.

Crimes e penas

O grupo, segundo denúncia da Procuradoria-Geral da República, responde pelos crimes de:

Organização criminosa armada

Tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito

Golpe de Estado

Dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado

Somadas, as penas contra Bolsonaro, por exemplo, podem chegar a até 46 anos de prisão, caso prevaleça o rigor máximo previsto em lei. Os demais acusados estão sujeitos a dosimetrias semelhantes, com variação segundo o envolvimento individual nas ações.

Algumas das defesas mais emblemáticas e desconectadas da lógica

Jair Bolsonaro
A defesa do ex-presidente classifica as acusações da Procuradoria-Geral da República (PGR) como “absurdas” e afirma não existirem provas concretas que o liguem a planos golpistas ou aos atos extremistas de 8 de janeiro. Sustentam que Bolsonaro determinou a transição de poder de forma “eficaz, pacífica e imediata”, negando qualquer ato para obstruir o processo eleitoral. O documento ressalta ainda que o ex-presidente buscou evitar o caos no país e que a acusação, baseada principalmente na delação de Mauro Cid, que eles consideram “sem credibilidade”, não se sustenta.

Walter Braga Netto (ex-ministro da Defesa e ex-candidato a vice de Bolsonaro)
A defesa do general pede a absolvição e rejeição da denúncia, negando qualquer repasse de dinheiro para financiar atos golpistas, como alegado pelo delator Mauro Cid. Dizem que a narrativa da acusação é “frágil” e baseada apenas na palavra de um delator, que apresentaria informações em momentos distintos e contraditórios. Também rejeitam a acusação de que Braga Netto coordenava ataques virtuais para pressionar altos comandos das Forças Armadas, alegando que tais provas seriam ilícitas e deturpadas. Além disso, atacam a imparcialidade do relator Alexandre de Moraes e pedem anulação do processo.

Augusto Heleno (Ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência)
A defesa do general nega sua participação com protagonismo na trama golpista, argumentando que as provas colhidas afastam qualquer hipótese de envolvimento relevante nesta articulação. Segundo os advogados, Heleno teve uma atuação meramente acessória e periférica, sem relevância causal para o suposto êxito do plano criminoso. Defendem sua inocência com base na análise das evidências e pedem sua absolvição, destacando que Heleno atuou contrariamente ao golpe ao aconselhar medidas legítimas durante o processo eleitoral.

Alexandre Ramagem (ex-diretor da Abin)
A defesa argumenta que Ramagem deixou o governo federal em março de 2022 para se dedicar à campanha eleitoral, portanto, não participou dos atos de radicalização posteriores. Sustentam que ele jamais integrou qualquer organização criminosa e que a acusação fere a lógica, pois seria contraditório que alguém empregado para garantir funcionamento democrático do Legislativo atuasse para aboli-lo. Alegam ainda que não há menção ao nome dele nos eventos de 2022 e que o processo deveria ser rejeitado por ofensa ao contraditório e ampla defesa.

Anderson Torres (ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do DF)
A defesa nega a participação de Torres no plano golpista, classificando o documento chamado “minuta do golpe” encontrado em sua residência como um “mero esquecimento material”, apócrifo e sem valor jurídico. Ele teria aprovado um plano para impedir invasões em Brasília e buscado preservar a integridade do STF, telefonando para seu substituto durante os dias críticos. Contestam a competência do STF para julgar o caso, solicitando que o processo tramite na primeira instância, alegando ausência de foro privilegiado.

Outras defesas argumentam que a acusação é genérica, questionando a ausência de provas específicas ligando diretamente seus clientes, e chegaram a pedir que alguns réus sejam julgados em instâncias inferiores, alegando que não detêm foro privilegiado.

Esses exemplos ilustram a tática comum entre os réus: reconhecer a grave situação, mas negar qualquer autoria ou envolvimento direto. Mesmo diante da montagem clara de um plano golpista e das evidências materiais, preferem desdenhar o material processual, tentar desacreditar as provas e apelar para teses tão mirabolantes que chegam a beirar o ridículo.O Supremo Tribunal Federal (STF) já destacou que as defesas “não negaram a violência dos atos em Brasília”, mas tentam romper a ligação de seus clientes com os crimes, numa manobra clara para tentar preservar suas imagens públicas. A gravidade das denúncias — envolvendo articulação para subversão do Estado Democrático de Direito —, no entanto, torna ainda mais desesperados os argumentos apresentados.

Essas defesas compartilham a tática de negar qualquer envolvimento consciente e direto, caracterizando as evidências apresentadas como frágeis, ilógicas ou fruto de interpretações distorcidas. Refutam fundamentos jurídicos do processo, questionam a imparcialidade do relator e tentam transferir o caso para instância inferior. No entanto, diante do conjunto vasto e detalhado de provas — depoimentos, gravações, documentos e delações — suas teses soam como última barreira de um roteiro “sem sentido”, evidenciando uma pesada estratégia para evitar responsabilização.

Ao final, essas defesas expõem não apenas a desfaçatez e o cinismo dos envolvidos, mas também a estratégia jurídica de mascarar o óbvio: a tentativa de golpe foi real, coordenada e planejada, e a negação das provas não faz mais que atestar a urgência da responsabilização.

O Metropolitano

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