Governos de SP e MG renunciam a mais benefícios fiscais do que perdem com tarifaço de Trump
Estados concedem incentivos bilionários que superam prejuízos esperados com aumento de tarifas dos EUA

Luciano Meira
Os governos de São Paulo e Minas Gerais têm ampliado suas políticas de renúncia fiscal, destinando mais recursos em benefícios para empresas do que o valor efetivamente estimado de perdas com o chamado “tarifaço” imposto pelos Estados Unidos. Embora a justificativa seja preservar a competitividade e amortecer impactos de crises externas, os valores renunciados anualmente pelos dois estados ultrapassam — por larga margem — os efeitos negativos diretos que as tarifas americanas devem causar à economia local.
Desde o anúncio do aumento de tarifas de importação pelo presidente dos EUA, Donald Trump, setores produtivos brasileiros, especialmente exportadores, vêm alertando para perdas significativas. O novo pacote eleva tarifas para produtos estratégicos, como aço, café e bens industrializados, afetando diretamente Minas Gerais e São Paulo — líderes nacionais em produção e exportação desses produtos. A estimativa oficial indica que São Paulo pode ter um prejuízo anual de R$4,46 bilhões, enquanto Minas Gerais perderia R$1,66 bilhão com a medida, totalizando cerca de R$6,1 bilhões por ano nos dois maiores estados exportadores do país.No entanto, o valor das renúncias fiscais supera de longe essas perdas. Apenas em 2025, o governo paulista prevê abrir mão de R$71,5 bilhões em benefícios e isenções fiscais, quantia que deve chegar a R$85,6 bilhões em 2026. Em Minas Gerais, a renúncia fiscal será de R$21,8 bilhões em 2025, podendo ultrapassar R$25 bilhões nos anos seguintes. Ou seja, enquanto o suposto prejuízo causado pelas tarifas americanas totaliza pouco mais de R$6 bilhões anuais, os governos estaduais estão dispostos a abdicar, juntos, de quase R$100 bilhões por ano em incentivos.
A distância entre o que se perde com o tarifaço e o que se renuncia em incentivos fiscais levanta questionamentos sobre a racionalidade e a eficiência dessas políticas. Governadores argumentam que as isenções são essenciais para manter empresas e empregos em território estadual, sobretudo diante do risco de fuga de empresas para estados concorrentes ou países com ambiente tributário mais favorável. A concorrência federativa e a necessidade de atrair e preservar investimentos têm sido usadas como justificativa central para manter e expandir pacotes bilionários de incentivos.
Especialistas, porém, alertam que o volume de receitas renunciadas compromete investimentos em áreas estruturantes como saúde, educação e infraestrutura — setores que também fortaleceriam a competitividade a médio e longo prazos. Para órgãos de controle e pesquisadores, há claros sinais de desequilíbrio entre o valor dos benefícios concedidos e o real impacto das crises externas, sinalizando a necessidade de uma revisão das políticas fiscais estaduais.
O aumento expressivo da renúncia fiscal em Minas e São Paulo, portanto, evidencia uma contradição: para compensar um prejuízo real que não chega a 10% do total das isenções anuais, os estados abrem mão de recursos vitais para o próprio desenvolvimento. Em contexto de desafios orçamentários e dívida elevada, a crítica à amplitude dos incentivos apenas se amplia. O debate sobre o custo-benefício das renúncias tende a crescer, especialmente com o agravamento de pressões fiscais e a necessidade de respostas eficazes a crises internacionais.