Justiça manda empresa de BH indenizar trabalhador demitido por uso de ‘dreads’
Valor da indenização foi definido em R$ 5.000

Luciano Meira
A partir de um áudio gravado pelo trabalhador, a Justiça do Trabalho condenou uma revendedora de veículos de Belo Horizonte ao pagamento de R$ 5.000,00 de indenização por danos morais, por ele haver sido demitido de forma discriminatória por usar “dreads” e tranças no cabelo. No áudio, o supervisor que demitiu o trabalhador deixa claro que o estilo do profissional gerava um impasse na empresa.O supervisor aponta o uso de “dreads” como algo que desagradava, visualmente, a empregadora: “A empresa busca transmitir uma postura mais séria, com um visual mais básico”, e ainda fala que a questão foi levantada em razão das “normas” da empresa, que ele – supervisor – não tinha dificuldade em seguir, pois “se veste normal, ao passo que o autor teria um estilo diferente”.
Perguntando se o trabalhador estaria disposto a se adequar às normas da empresa ou se isso significaria um empecilho ou um peso, o trabalhador se defendeu, informando que não abriria mão do cabelo, quando o supervisor voltou a informar que a situação gerava um impasse na empresa.
No áudio, o ex-empregado diz que havia se apresentado daquela forma na entrevista e que os “dreads” ou a forma dele de se vestir não foram empecilhos para a admissão na função de serviços de marketing.
O contrato vigorou somente de 13/3/2023 a 10/4/2023, quando foi encerrado unilateralmente pela empresa sem justa causa, que perante o juízo da 43ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte garantiu ao trabalhador a indenização. Na sentença, o juiz concluiu, com base na gravação, que o trabalhador foi alvo de discriminação contra a aparência pelo uso de “dreadlocks” e tranças.“Ora, o uso de ‘dreadlocks’ ou ‘dreads’ constitui prática enraizada na cultura afrodescendente, dotada de profundos significados culturais, sociais e espirituais. Trata-se, essencialmente, de uma expressão de identidade afrodescendente e de valorização da respectiva herança cultural, de modo a expressar orgulho e apreço por essa tradição. Cuida-se, além disso, de uma manifestação de espiritualidade, de liberdade e de conexão com a ancestralidade afrodescendente, além de trazer o significado de resistência a padrões estéticos eurocêntricos. Ao fim, relaciona-se com a livre possibilidade de empoderamento e autoafirmação, permitindo que as pessoas pertencentes a essa cultura expressem sua identidade”, disse o juiz na sentença.
A empresa recorreu da decisão e alegou que a demissão foi feita em função do poder diretivo do patrão e não houve discriminação, porém, o desembargador relator da Quarta Turma do Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais (TRT-MG), Delane Marcolino Ferreira, entendeu que o trabalhador foi alvo de discriminação no ambiente de trabalho em razão da aparência.
“Não apenas em razão da utilização de adereços, como aduzido pela empresa, mas em decorrência do corte de cabelo por ele utilizado, associado à etnia, o que é passível de reparação civil.”
Quanto ao valor da indenização, o magistrado disse: “Valendo-se sempre de critérios de proporcionalidade e razoabilidade, definidos pela doutrina e jurisprudência, o valor não pode ser tão elevado que importe em enriquecimento sem causa, nem tão ínfimo, a ponto de ser incapaz de suavizar o sofrimento do lesado e de servir de intimidação para o agente, considerando ainda o curto período de vigência do contrato de trabalho”.