O segredo do padre Julian

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Síria Malta

Quando o padre Julian chegou à cidade de Pedra do lobo, foi um Deus nos acuda! O jovem padre foi logo arrancando suspiro da mulherada. Alto, moreno e com lindos olhos verdes, o homem era pura tentação. Um verdadeiro convite ao pecado. Mas, convicto de sua opção e celibatário por força de vontade. O padre fazia-se de surdo para as cantadas indecentes e ignorando as assanhadas que vinham com safadezas para o seu lado. Diga-se ainda, que algumas libertinas faziam de tudo para roçarem peitos e bundas propositalmente no jovem padre.

— Falta de vergonha! Diziam as fofoqueiras de plantão. Houve até uma certa loira siliconada que teve a audácia de passar a mão no lindo traseiro do padre, tendo a desfaçatez de sair comentando pela cidade, causando inveja nas demais, todas loucas para bolinarem o padre. Segundo a loira, a bunda do padre era de uma dureza alucinante. Imagine toda essa firmeza na frente!

— Te esconjuro loira maldita!

Logo na primeira missa rezada por padre Julian, nunca se viu tanta minissaia em Pedra do Lobo, bem diferente das missas enfadonhas de padre Frederico. Gordo e ranzinza, o velho padre, cuspia e arrotava o maçante sermão sobre os poucos fiéis que ficavam a cochilar nos bancos da igreja. E só despertavam com os berros do padre Frederico, proclamando que todos iriam para o inferno.

— Com o padre Julian as coisas eram bem diferentes. A sua voz macia e rouca ecoava e arrepiava toda a igreja. Parecia que um coro de anjos celestiais saía de seus lábios, hipnotizando toda a plateia que assistia à missa encantada. Desde as novinhas, balzaquianas e até as vovós, rezavam com todo fervor. Seus corações ardiam como brasas, assim como suas saudosas pererecas, que queimavam de desejo a cada palavra dita por padre Julian. Que mal se dava conta dessa onda de excitação que tomava conta da igreja. Um fogo demoníaco consumia as mulheres de Pedra do Lobo.

Zizi travesti cruzava suas longas pernas em pose provocante, esperando por algum movimento comprometedor do padreco. Quem sabe até um olhar indiscreto. Mas nada abalava a boa conduta do santo padre.

A prostituta Lola, que fazia ponto no posto de gasolina, exibia seus desejados melões em generoso decote, os ofertando descaradamente ao honrado padre. Quando a pequenina cesta do dízimo passava, Lola se debruçava sobre ela e seus seios enormes, devidamente preenchidos com silicone, se derramavam sobre as moedas e notas de dois reais deixados pelos fiéis.

— Abençoados sejam os peitões de Lola! Dizia o cachaceiro Anselmo, que vez ou outra pagava cinquenta reais a prostituta por uma rapidinha. Isso quando conseguia fazer alguma coisa, porque na maioria das vezes ele brochava, já que bebia demais. O que fazia com que a coitada tivesse que pagar boquete, porque precisava muito do dinheiro. Tinha filhos pequenos em casa para cuidar. Além disso, não gostava que nenhum cliente saísse insatisfeito.

Mas quanto ao santo padre, não havia nenhuma reação maliciosa de sua parte em relação à fogosa prostituta. Julian ainda insistia em levá-la a se dedicar mais à igreja. Saindo de vez daquela vida impoluta e ser sua irmã em Cristo.

— Irmã de Cristo, porra nenhuma! Desdenhava a rapariga em seus devaneios. Seu desejo era poder dar de mamar ao delicioso padreco. Só de imaginar, o bico de seu peito ficava enrijecido. Imagina essas duas joias na boca gulosa do padre! Aquela barba negra e cerrada a arranhar-lhe a pele macia e rosada do seio. Hum! Devaneios de Lola.

— Maldição senhor, perdoai-nos pelos maus pensamentos!

As missas do padre Julian foram ficando cada vez mais populares. Era um desfile de perdição e luxúria. Os botecos perdiam espaço para os bancos da igreja. E a população retornou de vez para a casa de Deus. Finda a missa, as mulheres e alguns homens, porque não dizer, voltavam para casa com o padre Julian dominando seus pensamentos.

Em noites como essa, Pedra do Lobo era tomada por intensa energia sexual. Todos queriam copular com alguém ou com alguma coisa. Eram noites mal dormidas, na qual o desejo tomava conta de corpos e de almas.

Vontade de desnudar o padre, arrancar sua batina negra com loucura, beijar aquela boca vermelha, sentir o cheiro que exalava de seu pescoço. Explorar cada pedaço daquele corpo deliciosamente delineado para depois ser possuída por padre Julian.

— Ai Padre Julian, porque escolhestes caminhos tão tortuosos? Suspirava a virgem Gabriela, tomada pela luxúria do desejo que tanto lhe torturava o espírito. Antes dócil e recatado.
Mas longe da virgem Gabriela. Fechado e só em seu quarto na casa paroquial da cidade. Padre Julian se encontrava perdido em pensamentos e lutando contra seus demônios.

Pensava nas mulheres que se ofereciam pra ele na igreja. No fundo ele gostava do que a sua presença provocava nas pessoas. Tinha consciência de sua beleza, gostava de atrair o olhar das pessoas e ser desejado por quem quer que seja.

Mas o que o padre Julian queria mesmo, era ser como Juliano, o seu irmão gêmeo. Juliano não era bonito como o padre Julian, não herdara os belos olhos verdes da família e não tinha um terço do charme do seu irmão. Na realidade ele era um bruto e ignorante. Nem mesmo sabia se xoxota era com x ou ch, mas tinha uma qualidade invejável. Sabia fazer uma mulher feliz como ninguém! Era um amante incrível, insaciável e bem dotado, e que fazia jus a sua fama de garanhão.

Juliano era mecânico em Alvorada de Minas, uma cidadezinha próxima a Pedra do Lobo. Possuía uma oficina ordinária e no fundo dela, havia um quartinho mequetrefe, onde Juliano usava para degustar as mulheres de Alvorada. A mulherada fazia fila para fornicar com Juliano. Um despropósito! Mecânico filho da puta! Quem dera ser assassinado por um marido corno!

— Vá copular com a demônio!

Padre Julian daria toda sua beleza em troca da virilidade de Juliano. Na verdade, o padre Julian não teve outra opção a não ser se tornar padre. Seria melhor entrar para a igreja, pois assim as mulheres o cobiçariam e ele poderia usar o celibato como desculpa para as frequentes investidas. Não porque não as quisesse, ele as desejava e muito. Mas o padre Julian era impotente. E ele preferia morrer a ter esse segredo revelado.

Só e infeliz no escuro de seu quarto, padre Julian tentava dormir. Seu corpo bonito e nu repousava sobre lençóis brancos e amassados. O olhar do padre se fixou em seu sexo que parecia dormir e que jazia inerte e preguiçoso sobre uma montanha macia de pelos. Cabisbaixo e inútil. E era assim que ele também se sentia.
Inútil.

Síria Malta

Professora e mãe de menina. Sempre apaixonada pelas leituras, tenho nítido na memória uma época em que, descalça, escalava as íngremes escadas daquela que foi a primeira biblioteca de Itaguara. Lugar que me ajudou a construir a pessoa na qual me transformei. Pena que esse hábito de leitura perco-o pouco a pouco na mesma medida em que o olhar já não é capaz de reconhecer à riqueza de seu significado.
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