Voto de Moraes condena Bolsonaro como líder de organização criminosa e todos os integrantes do núcleo crucial da tentativa de golpe
Ministro do STF considera ex-presidente chefe de organização criminosa; todos os integrantes do núcleo crucial devem receber condenações pesadas

Luciano Meira
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou pela condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro e de todos os integrantes do chamado Núcleo Crucial, considerados os principais articuladores da tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022. Bolsonaro foi apontado como líder da organização criminosa formada para promover a ruptura do Estado Democrático de Direito. O voto de Moraes destaca os atos executórios praticados, fixa as penas previstas para cada envolvido e utiliza expressões contundentes para tratar a gravidade dos crimes, incluindo menções irônicas a respeito da ação dos réus.Quem são os condenados
O Núcleo Crucial reuniu oito nomes centrais da operação golpista, de acordo com Moraes e com a Procuradoria-Geral da República:
Jair Bolsonaro (ex-presidente da República)
Mauro Cid (tenente-coronel, ex-ajudante de ordens)
Walter Braga Netto (general da reserva, ex-ministro da Defesa e candidato a vice-presidente)
Alexandre Ramagem (deputado e ex-diretor da Abin)
Almir Garnier (almirante, ex-comandante da Marinha)
Anderson Torres (ex-ministro da Justiça)
Augusto Heleno (general, ex-ministro do GSI)
Paulo Sérgio Nogueira (general, ex-ministro da Defesa)
Crimes atribuídos e penas aplicadas
A denúncia narra cinco crimes principais:
Organização criminosa armada
Tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito
Golpe de Estado
Dano qualificado pela violência e grave ameaça contra patrimônio da União
Deterioração de patrimônio tombado
Alexandre Ramagem responde apenas por três dos cinco crimes, em razão de decisão da Câmara dos Deputados. Em função das funções de liderança atribuídas, especialmente a Bolsonaro, as penas podem chegar a mais de 40 anos de prisão ao todo para cada um dos principais condenados.
O que são atos executórios e outras expressões do voto
No voto, Moraes destacou a existência de “13 atos executórios” — ações concretas e deliberadas que demonstram a intenção de consumar o golpe, como reuniões ministeriais, transmissões ao vivo e discursos públicos incitando subversão. No contexto penal, “ato executório” é aquele que dá início à realização efetiva de um crime e aproxima a conduta do resultado ilícito.
Trechos e citações marcantes do ministro
“Estamos esquecendo aos poucos que o Brasil quase volta a uma ditadura que durou 20 anos, porque uma organização criminosa, constituída por um grupo político, não sabe perder eleições”, declarou Moraes em tom crítico.
Outro trecho do voto revela a ironia: “Quem perde, vira oposição e disputa as próximas eleições. Quem ganha, assume e tenta se manter nas eleições, mas tenta se manter pelo voto popular”.
Sobre a execução do crime, afirmou: “A mera tentativa consuma o crime”, indicando que, mesmo sem êxito, a tentativa organizada já caracteriza os delitos julgados.
Penas individuais
As penas finais atribuídas devem variar conforme o grau de participação e os crimes imputados, podendo superar 40 anos para Bolsonaro, devido ao papel de liderança da organização criminosa armada e à soma das infrações. Para os demais, as penas variam de acordo com as condutas e cargos ocupados, mas se aproximam do mesmo patamar devido à gravidade dos delitos, segundo o voto do relator. O total das penas de cada réu deverá ser divulgado na sexta-feira (12), após serem colhidos os votos de todos os Ministros da 1ª Turma e discutida a dosimetria.
Contexto
A decisão de Moraes inaugura a votação na Primeira Turma do STF e consolida o entendimento do Supremo de que houve, de fato, tentativa de golpe e quebra da ordem democrática. O julgamento é considerado histórico por envolver, pela primeira vez, um ex-presidente da República e líderes militares e civis de alto escalão na tentativa de golpe no Brasil contemporâneo.
Por que isso importa
O voto de Moraes marca um ponto de inflexão na responsabilização penal de autoridades envolvidas em ataques à democracia e mostra que, para o STF, atos preparatórios e tentativas, mesmo sem êxito, são suficientes para o enquadramento criminal e duras sanções.