Zema lança candidatura em São Paulo: ingresso a R$ 100, auditório gourmet e a confirmação de que o “Novo” já nasceu velho
Evento na AmCham reúne empresários, parlamentares irrelevantes e convidados polêmicos como Deltan Dallagnol; partido enterra discurso da pureza e abraça de vez o Fundo Partidário

Luciano Meira
O governador Romeu Zema (Novo) escolheu o palco perfeito para lançar sua candidatura em São Paulo: a sede da AmCham, a Câmara Americana de Comércio, instalada em um dos endereços mais caros da capital paulista. Nada de praça pública, nada de muvuca no asfalto — o evento político será disputado a R$ 100 o ingresso, com espaço para até 1.200 assentos climatizados esperando uma plateia de empresários de bermudas de brim e camisa polo, executivos treinados em networking e simpatizantes da elite que ainda acreditam que Zema pode ser a novidade que as pesquisas insistem em não mostrar.
Mas enquanto o auditório é nobre e modular, seja qual for o número de participantes sempre se dá um jeito de na foto parecer lotado, o cardápio político é ralo. Os parlamentares do Novo, que vão dividir o palco com o governador, são tão poucos que poderiam chegar de carona numa kombi. E, mesmo assim, sobraria espaço. Desde 2018, a legenda aprovou menos de 50 projetos próprios no Congresso — uma performance legislativa de partido nanico, mas embalada como gestão revolucionária. Quem olhar a prateleira de realizações encontra pouco mais do que pó.
Para compensar a irrelevância, vem a pirotecnia das presenças especiais. Um dos destaques é o ex-deputado cassado e condenado Deltan Dallagnol, outrora ícone da moralidade e hoje personagem reciclado em palco de campanha. Sua participação é um resumo involuntário da lógica do Novo em 2025: “na boleia vou eu, na caçamba quem couber”. Figuras hostis ao Judiciário e simpatizantes de flertes golpistas também devem aparecer, numa mistura de elenco secundário que reforça o clima de convenção corporativa com pitadas de ressentimento político.
O número final do espetáculo, no entanto, é o mais revelador. O partido que nasceu apresentando-se como o “Novo”, o “limpinho e cheiroso”, a “Soninha toda pura” que repetia como mantra não gastar um centavo de dinheiro público, decidiu assumir de vez sua metamorfose: agora nadará, sem cerimônia, no Fundo Partidário. Um mergulho pragmático e sem pudores, vestido com o uniforme oficial da política tradicional: “sou igual aos outros — e daí?”. O que um dia se anunciou como revolução de costumes se converteu em “moral flex”, a ponto de caber de Deltan a empresários entediados num mesmo palco.
O evento, assim, é menos o pontapé de uma candidatura e mais a caricatura de um projeto político. Com ingressos pagos, plateia selecionada e discursos prontos para agradar ao público-alvo, o “novo” confirma o mofo. Zema, que ainda não empolga as massas, estreia em São Paulo como quem lança um produto em shopping de luxo: com vinho branco, canapé e ar-condicionado. Para a elite, soa refresh. Para o eleitor comum, soa distante — e caro.
No fim, o evento do Novo é metáfora perfeita: uma vernissage eleitoral em que o ingresso compensa a falta de multidão, o discurso compensa a falta de obra, e o fundo público compensa a falta de coerência. A democracia pode até ser para todos; já a campanha de Zema é para quem tem nome na lista, sapato engraxado e cem reais no bolso.