Em ação de marketing eleitoral, vice-governador comparece dois dias seguidos na Assembleia Legislativa de MG

Estado busca adesão ao Propag com pacote de projetos na ALMG para renegociar dívida de R$ 165 bilhões

Mateus Simões (Novo), vice-governador Foto: Luiz Santana/ALMG
Luciano Meira

Na tentativa de renegociar sua bilionária dívida com a União, o governo de Minas Gerais apresentou um pacote de 12 projetos de lei e uma Proposta de Emenda à Constituição Estadual (PEC) à Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). O objetivo é viabilizar a adesão do Estado ao Programa de Pleno Pagamento das Dívidas dos Estados com a União, conhecido como Propag.

O Propag surge como uma alternativa ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF), ao qual Minas Gerais aderiu em 2023. A proposta permite que os Estados usem ativos públicos, como imóveis e estatais, para amortizar parte de suas dívidas. O prazo final para adesão ao programa é 31 de dezembro de 2025, sendo necessária a aprovação dos projetos pela ALMG e regulamentação até lá.Em estilo de apresentação “Power Point”, o vice-governador Mateus Simões (Novo) fez uma longa exposição de slides, com comentários que frequentemente pendiam para observações políticas em um assunto que demandaria apenas análises técnicas aprofundadas.

Sem que nenhum deputado tivesse tido contato oficial com os projetos, o pacote apresentado inclui uma lei específica para a saída do RRF e a entrada no Propag, detalhando prazos, etapas e compromissos fiscais. Além disso, prevê a gestão de ativos financeiros, permitindo a cessão de direitos creditórios do Estado para a União (como impostos atrasados e dívidas judiciais) e a venda de imóveis públicos, cujas arrecadações seriam diretamente destinadas à quitação da dívida. A regulamentação da Compensação Previdenciária (Comprev) entre os regimes estadual e federal também está no pacote para equilibrar as contas.

Analisando apenas o que foi apresentado, o ponto central do plano parece ser a federalização de estatais mineiras, abrindo caminho para transferir essas empresas à União como forma de abater o débito. Projetos de lei específicos tratam da possível federalização da Cemig (estimada em R$ 7 bilhões), Copasa (estimada em R$ 4 bilhões), Codemig e Codemge (estimativa conjunta de R$ 22 bilhões) e da Empresa Mineira de Comunicação (EMC), cujo valor ainda será estimado. Há também uma lei de autorização geral para a federalização de outras estatais no futuro.

Outra proposta espantosa é a transferência da gestão da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) para o governo federal. A medida visa reduzir gastos estaduais com ensino superior, mantendo os serviços. Estima-se que imóveis da UEMG possam somar até R$ 500 milhões no abatimento da dívida.

Toda essa disposição do patrimônio do Estado busca abater cerca de 20% da dívida total, aproximadamente R$ 34 bilhões (com a meta de oferecer ativos que somem R$ 40 bilhões para, segundo o vice-governador, ter uma “folga” logo no início, através da transferência, garantindo a menor taxa de juros possível dentro do Propag). Além dos ativos mencionados, há levantamentos sobre a transferência de créditos referentes à Lei Kandir (estimados em R$ 2 bilhões) e a cessão de créditos da dívida ativa do Estado. Complementando o pacote, uma PEC já protocolada na ALMG propõe que a venda ou federalização de estatais dependa de aprovação via referendo popular.

Simões, que até hoje concordou com o que ele mesmo chama de agiotagem imposta pelo Regime de Recuperação Fiscal do governo passado, falou em desafios, como a necessidade de derrubar vetos do Presidente Lula à Lei Complementar federal que instituiu o Propag para incluir “contratos garantidos” na amortização e permitir que o Estado mantenha metade da Codemig, o que representaria a manutenção de receitas anuais significativas para Minas, claramente politizando a questão.

A adesão ao Propag exige que o Estado indique os ativos a serem federalizados e publique as leis autorizativas até 30 de outubro de 2025.

Deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT) Foto: Luiz Santana/ALMG

Presente na audiência, a deputada Beatriz Cerqueira (PT) fez observações e críticas aos projetos apresentados: “Esta discussão teria que ser feita de forma mais ampla, os projetos deveriam ser apresentados primeiro e depois ele viria aqui para conversarmos. Não houve a apresentação dos projetos, foi uma hora e 17 minutos de fala, ele passou 50 minutos trazendo o contexto, explicando os detalhes do projeto federal. Aqui nós deputados temos a assessoria da ALMG, a assessoria dos gabinetes, os deputados podem fazer a leitura dos projetos, mas acho que a apresentação foi estruturada desta forma para não entrar no conteúdo dos projetos e eventualmente expor o vice que poderia ser obrigado a prestar alguns esclarecimentos”.

Os esclarecimentos aos quais a deputada se refere são, entre outros, sobre os créditos da Lei Kandir, negociados por R$ 8 bilhões, enquanto o vice-governador mencionou apenas R$ 2 bilhões, e os precatórios de R$ 11 bilhões que o Estado tem a receber do FUNDEF. “O vice-governador não falou nada sobre este assunto, isso é grave, devemos ter acesso a estes conteúdos, por isso fica claro que a presença dele aqui tem um simbolismo de uma suposta gentileza com a ALMG, mas também há o marketing de mostrar-se uma pessoa preparada, que tem conteúdo, que sabe explicar as coisas, mas há informações apresentadas por ele que não são reais”, disse Beatriz.

A deputada contesta a porcentagem da aplicação em Educação no ano de 2019. Simões fala em 25%, mas a deputada afirma que o percentual investido foi de 19%. “O governo sabe como funciona o processo legislativo, os projetos só chegam para os deputados após serem recebidos pela Mesa, portanto vir aqui antes disso, antes que os deputados tivessem acesso aos projetos, não parece ter algum objetivo além de marketing”.

Também foi alvo de críticas da deputada a colocação de que, caso o Estado não consiga antecipar 20% do pagamento para garantir juros menores, não haverá adesão ao Propag. “O vice-governador veio aqui e estabeleceu condições, se não tiver 20%, não aderimos. Então, vamos voltar de novo à fala do discurso único, da imposição, de que se não for assim, não serve? Então, pode fechar a Assembleia. Porque se ele já está dizendo como tem que ser e a Casa Legislativa não pode ter nenhum papel em relação ao que ele está apresentando, então, fecha a casa”.

Mais adiante, a deputada também comenta a mudança de postura do governo. “É desrespeitoso ter vinculado a discussão do Propag à questão dos vetos, os vetos não são definidos nesta Casa. Então fica claro que o governo veio aqui para fazer uma marcação de posição política diante de uma grave situação de Minas Gerais que precisa negociar a sua dívida com a União. Como que no governo Bolsonaro, tudo bem, a gente aceita a agiotagem, mas quando é o governo Lula, quantas vezes o vice-governador criticou? Quando era o governo Bolsonaro, estava tudo bem, aliás, concordava com a agiotagem, tanto é que mandou para cá o projeto de lei do Regime de Recuperação Fiscal, então, é preciso ter mais respeito”.

A deputada ainda levantou questões relativas à federalização da Universidade Estadual de Minas Gerais – UEMG, especialmente após o vice-governador mencionar R$ 500 milhões em imóveis pertencentes à Universidade, e lembrou que o governo Zema concedeu muitas isenções fiscais.

“Dada a complexidade do assunto, a UEMG acordou surpreendida com uma possibilidade de federalização, que a universidade não sabia e que, de acordo com o que o vice-governador afirmou, diz respeito a imóveis. 500 milhões de imóveis, vamos conversar sobre todas as chances que o governo do Estado teve para diminuir os benefícios e as isenções fiscais, que são da ordem de bilhões, durante esses seis anos do governo Zema. Temos que aprofundar no conteúdo, porque senão fica o marketing da vinda dele aqui, a simbologia, mas no conteúdo não teve aprofundamento nenhum”, finalizou a deputada.

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