O roto falando do rasgado: Aécio acusa Zema de incompetência
Zema colocou Minas Gerais à venda, sinal da incompetência da gestão estadual acusa Aécio

Luciano Meira
O deputado federal e ex-governador de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB), criticou duramente a proposta do atual governador, Romeu Zema (Novo), de oferecer bens públicos estaduais à União para abater a volumosa dívida de Minas. Em nota, Aécio declarou que “o governador Zema colocou Minas Gerais à venda”, classificando a decisão como “grave” e um sinal da “incompetência da gestão estadual”, que “se especializou em transferir responsabilidades”.
A lista de bens enviada à Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), como parte do Programa de Pleno Pagamento da Dívida dos Estados (Propag), inclui mais de 300 imóveis. Entre os ativos listados para possível federalização ou privatização estão estruturas de grande valor simbólico e funcional para os mineiros. Surpreendentemente, a lista inclui a Cidade Administrativa — sede do governo e marco da gestão de Aécio —, além de unidades da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) e da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), o Palácio das Artes, o Hospital Risoleta Neves, o Colégio Estadual Central de Belo Horizonte, créditos da Empresa Mineira de Comunicação (EMC) e da Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig). A proposta também abre caminho para a privatização da Cemig e da Copasa.
A dívida do estado com a União, que Zema busca reduzir com a federalização de ativos — equivalentes a, no mínimo, 20% do estoque, cerca de R$ 34 bilhões —, gira em torno de R$ 165 bilhões.
Aécio criticou a proposta, alegando que Zema está “dilapidando o patrimônio dos mineiros” por “falta de competência para ajustar as contas públicas estaduais”. Ele provocou a sociedade civil, a ALMG e o Ministério Público a agir, reforçando seu slogan: “Minas não está à venda”. Para o ex-governador, as propostas de Zema “atendem ao Governo Federal”, mas “não atendem a Minas Gerais”, sendo “temerárias, precipitadas e profundamente lesivas aos interesses do povo mineiro”.
Ironicamente, as declarações de Aécio sobre “incompetência” e “dilapidação do patrimônio” ecoam avaliações feitas sobre a situação do estado após os 12 anos de gestão do PSDB, período que incluiu seus mandatos e os de seu sucessor e aliado político, Antonio Anastasia. Uma auditoria realizada no início do governo de Fernando Pimentel (PT), em 2015, logo após a saída do PSDB, identificou um déficit orçamentário de R$ 7,2 bilhões e classificou a situação do estado como “muito grave”, decorrente de uma “ausência real e clara de gestão”.
O levantamento de 2015 apontou falta de coordenação no gerenciamento de obras — com quase 500 obras paralisadas — e problemas na administração da folha de pagamento. Criticou a falta de planejamento na gestão da água e a situação crítica de reservatórios. Até mesmo a Cidade Administrativa, idealizada por Aécio e agora listada para venda, foi alvo de críticas na auditoria de 2015, apontada por não gerar economia e sim um custo anual de R$ 120 milhões. O relatório também mencionou um déficit de R$ 1,5 bilhão na área da saúde e a situação precária das escolas, com apenas 26% em boas condições.
Assim, enquanto Aécio critica a tentativa de Zema de equacionar a gigantesca dívida estadual com a venda de patrimônio, o contexto histórico sugere que a origem e o agravamento dessa dívida se consolidaram em gestões anteriores, incluindo a sua. O patrimônio que agora estaria “à venda” faz parte de um estado cujas finanças e gestão foram questionadas ao final do período em que Aécio e seu grupo político estiveram no poder.
O Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag), que tramita na ALMG, foi a alternativa encontrada para Minas equacionar sua dívida com a União. A tramitação, iniciada esta semana, tem sido alvo de discussões e debates intensos, especialmente após a divulgação da lista de bens imóveis sujeitos à venda ou federalização.
Ao perceber a resistência dos deputados, inclusive da base governista, interlocutores do Estado se apressaram em afirmar que a lista não é definitiva, mas apenas uma “sugestão”, o que gerou ainda mais desconfiança entre os parlamentares. Muitos passaram a acreditar que a intenção do governo é obter uma autorização genérica para se desfazer do patrimônio estatal sem necessidade de novas aprovações do Legislativo.

A deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT), antes mesmo da tramitação do projeto, já alertava sobre o desrespeito ao Legislativo por parte do governo. Ela criticou a postura do vice-governador Mateus Simões (Novo), que, em uma ação de marketing político-eleitoral, protocolou o projeto sem apresentar dados concretos nem explicações detalhadas. Cerqueira destacou que o vice-governador chegou a sugerir que, caso o projeto não fosse aprovado conforme proposto, ele não seria implementado, mencionando vetos do presidente Lula (PT), como aconteceria em outros Estados, o que foi desmentido pelos governadores de Goiás, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro citados por Simões.
A deputada também demonstrou preocupação com a falta de transparência do governo e a venda de imóveis utilizados por setores essenciais, como educação, cultura e saúde. Segundo ela, “a entrega do patrimônio de Minas Gerais, dos mineiros, poderá ser feita com descontos de até 45%”, o que representa valores expressivos sem garantias de que não ocorrerão favorecimentos indevidos. Ela também alertou sobre a inclusão de escolas, unidades da UEMG, o Palácio das Artes, hospitais e até imóveis do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais (IPSEMG) na lista de ativos a serem negociados.
Cerqueira ressaltou que há necessidade de ampliação, e não de diminuição, dos serviços públicos nas áreas de educação, cultura e saúde, e que a venda desses imóveis pode comprometer o atendimento à população. A deputada também apontou para as renúncias fiscais do governo, que superam 30% da arrecadação e são mantidas sob sigilo.