Profecia do apocalipse para 23 de setembro testa resistência do mundo — de novo
Sul-africano diz ter “recebido data” de retorno de Jesus, reacende memes e dúvidas já tradicionais; neopentecostais seguem apostando no arrebatamento, para espanto (ou deboche) das demais religiões

Luciano Meira
Mais um dia, mais um apocalipse: nesta terça-feira (23), o planeta deveria — se tivéssemos seguido o roteiro do Pastor Joshua Mhlakela — ter entrado oficialmente em colapso final, com o retorno triunfal de Jesus, planetas desalinhados, e as timelines entupidas de memes e hashtags “#FimdeMundo”. Se você está lendo este texto e ainda consegue pagar boleto, lamentamos informar: o mundo segue normalmente com todos os problemas e apocalipses cotidianos de sempre.
O profeta da vez
Joshua Mhlakela, pastor evangélico sul-africano, garante que a revelação veio “direto de Deus” em sonhos, complementada por visões dignas dos melhores efeitos especiais bíblicos: Jesus no trono, exército de seres poderosos, juízo final — tudo programado para 23 (ou 24, caso haja atraso divino) de setembro, coincidindo com o Rosh Hashaná, o Ano Novo Judaico. O anúncio, claro, viralizou rápido em redes sociais, conquistando fiéis esperançosos e ganhando aquela tradicional cobertura dos mesmos céticos e humoristas que já colecionaram calendários maias de 2012 e pacotes “Fim do Mundo” do planeta Nibiru.
Arrebatamento: só para convidados?
No centro da profecia está o conceito do arrebatamento — doutrina cara ao universo neopentecostal, que promete que os salvos seriam subitamente transportados para o céu, enquanto o resto do planeta enfrentaria o caos, filas no supermercado e boletins do apocalipse na TV. O fenômeno, apesar de popular entre segmentos evangélicos (pesquisa recente estima que 61% dos líderes do movimento acreditam nisso), não encontra respaldo em boa parte das demais denominações cristãs, nem, diga-se, na ciência ou no manual do senso comum.
Erros proféticos, retrospectiva
A lista de datas marcadas para o fim do mundo já é tão extensa quanto manual de telemarketing. Entre os fracassos clássicos, figuram o bug do milênio, o apocalipse maia 2012 e aquela história recorrente sobre “Nibiru” colidindo com a Terra. Por mais que os profetas mudem, o saldo final permanece igual: o planeta gira, a Internet não perdoa, as igrejas parcelam dízimos.
Seitas, credos e os deixados para trás
O pastor Joshua é tipicamente associado a círculos evangélicos de corte neopentecostal, ambiente pródigo em interpretações literais e — por vezes — criativas dos textos bíblicos. Mas poucas linhas da fé cristã tradicional embarcam nessa leitura literal do arrebatamento e do cronograma celestial. Até mesmo dentro do próprio movimento evangélico, há quem siga o conselho bíblico: “Quanto ao dia e à hora ninguém sabe, nem os anjos dos céus, nem o Filho, senão somente o Pai” (Mateus 24:36, para quem quiser se precaver antes de sair vendendo tudo o que tem ou largar o emprego).
Fim do mundo? Só no próximo episódio
Assim seguimos, sobreviventes do apocalipse de terça-feira, aguardando a próxima temporada. Enquanto isso, recomenda-se prudência ao marcar data para o fim do mundo. Afinal, para muitos brasileiros, o “juízo final” é sempre no fim do mês, e não há profeta neopentecostal capaz de livrá-los do carnê.