STF convoca audiência pública sobre pejotização em meio a disputa com TST

Divergência entre cortes ameaça proteção trabalhista e gera insegurança jurídica para milhões de brasileiros

STF – Foto: Reprodução
Luciano Meira

O Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior do Trabalho (TST) vivem um impasse sobre a chamada pejotização — prática de contratar trabalhadores como pessoas jurídicas (PJ) em vez de assalariados. Em audiência pública convocada pelo ministro Gilmar Mendes, a ser realizada nesta segunda-feira (6), a partir das 08h, o STF debaterá os impactos dessa modalidade de contratação, que segundo especialistas pode representar tanto modernização quanto precarização das relações de trabalho. Enquanto o Supremo tende a validar contratos de PJ como forma legítima de terceirização, o TST insiste em analisar a realidade da prestação de serviços para identificar vínculos trabalhistas disfarçados, criando um cenário de insegurança jurídica e processos paralisados.

Em abril de 2025, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a suspensão nacional de todos os processos que tratam da legalidade da contratação de trabalhadores como pessoas jurídicas — prática conhecida como pejotização — até que o mérito do chamado Tema 1389 seja julgado pelo plenário do STF. A decisão foi motivada pelo aumento exponencial de ações sobre o tema e pela insegurança jurídica gerada por entendimentos divergentes entre a Justiça do Trabalho e o STF. Com a suspensão, todas as discussões judiciais sobre pejotização ficaram paralisadas em todo o país, enquanto se aguarda uma decisão definitiva da Corte, que pretende uniformizar a jurisprudência e estabelecer diretrizes sobre a validade desses contratos no mercado de trabalho brasileiro.

O que está em jogo

A pejotização, estimulada por determinados setores empresariais e permitida de forma mais ampla após a reforma trabalhista de 2017, consiste em substituir o contrato de trabalho regido pela CLT por um contrato civil de prestação de serviços firmado por uma empresa de pequeno porte, muitas vezes criada pelo próprio trabalhador. Para defensores, esse modelo dá flexibilidade e reduz custos. Para críticos, porém, fragiliza a proteção social, elimina benefícios como FGTS e férias, e transfere ao trabalhador riscos típicos de empreendedores.

Entendimento do TST

O Tribunal Superior do Trabalho tradicionalmente adota como critério central a primazia da realidade — ou seja, o que importa são as condições reais de trabalho, e não apenas a forma do contrato. Pessoalidade, onerosidade, habitualidade e subordinação são requisitos definidos pela CLT para caracterizar vínculo empregatício. Quando esses requisitos estão presentes, mesmo em caso de contratação como PJ, o TST tende a reconhecer vínculos e condenar empresas por fraude.Embora nos últimos anos tenha flexibilizado parte de seu entendimento, validando contratos de PJ em casos sem subordinação direta, o TST segue considerando essa prática de alto risco para a proteção do hipossuficiente.

Entendimento do STF

O STF, por sua vez, vem ampliando a aceitação da pejotização e aproximando-a da lógica da terceirização lícita. Em decisões recentes, a Corte equiparou contratos civis entre empresas a uma modalidade legítima de prestação de serviços, transferindo a análise para a Justiça Comum e afastando a competência trabalhista — salvo em casos de fraude comprovada. Para ministros como Gilmar Mendes, essa abordagem privilegia segurança jurídica e autonomia empresarial.

Risco de precarização

A divergência entre as cortes produz efeitos profundos. Empresas reforçam sua defesa levando casos ao STF para reverter decisões da Justiça do Trabalho. Enquanto isso, trabalhadores ficam sem acesso a direitos básicos previstos na CLT e sem solução para processos em curso. Especialistas alertam que, dependendo do desfecho do Tema 1389, a pejotização pode se tornar regra, institucionalizando modelos que fragilizam garantias como FGTS, férias remuneradas e contribuições previdenciárias.

O julgamento definitivo do STF terá impacto estrutural nas relações de trabalho e pode redefinir o alcance da Justiça do Trabalho no país. Até lá, o embate jurídico segue, e empresas e trabalhadores convivem com um cenário de indefinição.

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