Bolsonaro chama de “malucos” os próprios apoiadores e abandona até os presos do 8 de janeiro
Depois de todas as manifestações e de receber mais e R$ 17 milhões em doações “mito” mostra sua cara

Luciano Meira
Em mais um episódio de distanciamento e ironia, o ex-presidente Jair Bolsonaro, durante depoimento ao Supremo Tribunal Federal, não hesitou em rotular de “malucos” os próprios seguidores que acamparam por meses nas portas dos quartéis, pedindo intervenção militar para mantê-lo no poder. O que antes era encorajado nos discursos inflamados virou agora objeto de deboche e desprezo, principalmente quando a Justiça bate à porta do ex-mandatário.
Abandono dos apoiadores e dos presos
O desprezo de Bolsonaro não se limitou aos acampados que enfrentaram privações, humilhações e situações bizarras, como o famoso “patriota do caminhão” ou Dona Fátima de Tubarão. O ex-presidente também virou as costas para aqueles que pagam o preço mais alto: os presos dos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023. Mais de 200 pessoas já foram condenadas a penas que chegam a 17 anos de prisão por crimes como golpe de Estado, dano qualificado e associação criminosa. Entre eles estão figuras anônimas, sem qualquer poder de liderança, que agora cumprem penas longas e pesadas, muitos já abandonados até pelos antigos colegas de acampamento.Esses condenados, agora chamados de “malucos” pelo próprio líder que idolatravam, foram jogados à própria sorte. Enquanto Bolsonaro tenta se desvencilhar de qualquer responsabilidade, seus apoiadores mais radicais amargam sentenças que, mesmo com possibilidade de progressão de regime, significam anos atrás das grades e o pagamento de indenizações milionárias. Para muitos, restou apenas a amarga constatação de que foram usados como massa de manobra e, quando não serviam mais, descartados como estorvo inconveniente.
O circo dos acampamentos e a ilusão coletiva
A rotina dos acampados era marcada por sacrifícios e situações surreais: vendas de brigadeiro para sobreviver, noites mal dormidas em barracas improvisadas e uma fé cega na promessa de que o “mito” jamais os abandonaria. Mas o roteiro foi outro: ao menor sinal de risco pessoal, Bolsonaro levantou mais e R$ 17 milhões em doações via PIX e tratou de se afastar, reduzindo a luta de seus seguidores a um espetáculo de excentricidade.
Os casos emblemáticos, como o do “patriota do caminhão” e de Dona Fátima de Tubarão, se somam agora aos dos presos do 8 de janeiro, que enfrentam penas de até 17 anos, além de multas e indenizações coletivas de dezenas de milhões de reais. A maioria desses réus sequer participou do planejamento dos atos, mas foi arrastada pela onda de desinformação e pelo efeito manada que tomou conta dos acampamentos — tudo sob o olhar complacente (e agora irônico) do ex-presidente.
Ironia e tragédia: o preço de seguir o “mito”
A postura de Bolsonaro diante de seus seguidores presos é, no mínimo, cruelmente irônica. Aqueles que acreditaram até o fim na retórica golpista e pagaram com a liberdade, agora são tachados de “malucos” e abandonados à própria sorte. Enquanto isso, o ex-presidente tenta se apresentar como vítima e estadista, jogando a responsabilidade sobre os ombros dos que, até ontem, o chamavam de “capitão”.
No fim das contas, a história dos acampados, dos personagens bizarros e dos presos do 8 de janeiro é uma lição amarga sobre o custo do fanatismo político: foram enganados, usados e, quando não serviam mais, descartados pelo próprio ídolo. O roteiro é conhecido, mas não deixa de ser trágico — e, para quem observa de fora, até cômico, se não fosse tão cruel.